Lugares do Nosso Património
"O SENHOR DA BOA MORTE" JUNTO A CABRIS
Por: Fernando Carlos Taveira Cardoso Teixeira
(Março de 2002)
A nossa região é
rica em lugares e imóveis com grande interesse patrimonial. Estes espaços e
construções são muitas vezes desconhecidos pelos próprios locais. E sempre bom
lembrar que fazem parte de uma memória viva dos nossos antepassados. Muilos
deles pertenceram às nossas próprias famílias. Falo deste modo por pensar que a
nossa sociedade preserva o espírito e a essência da família, mas muitas vezes
ignora as obras arquitetónicas, culturais e sociais que os nossos antepassados
com muito esforço e dedicação fizeram. E esta incoerência que, ao mesmo tempo
com outros fatores, tem levado ao esquecimento de setores tradicionais da nossa
economia, da degradação da nossa paisagem e da nossa cultura local. É com muita
mágoa que vemos constantemente a destruição da paisagem tradicional,
nomeadamente, através do retirar de pedras de antigos muros que ladeiam
caminhos e lugares, muitos deles remontando aos primórdios da nacionalidade. E
há mesmo casos em que essas pedras carregadas de história são vendidas aos
nossos Irmãos Espanhóis?!
Também existem zonas de exploração, as
pedreiras... Estes locais depois
de explorados, são muitas vezes abandonados, tornando-se
feridas na paisagem, como aconteceu com a pedreira da Barragem do Vilar que
desde os anos quarenta assim permanece.
Muitos mais exemplos poderíamos citar,
mas, a ideia deste artigo é divulgar o património, por isso, hoje apresento-vos
um lugar encantador: “O Senhor da Boa Morte”, junto a Cabris. A existência
deste lugar deve-se, segundo explicação de populares, à necessidade do povo de
Cabris guardar o pão junto à Quinta do Pinheiro, lugar que tinha uma grande
eira que hoje se encontra completamente abandonado.
Este
conjunto arquitectónico apresenta-nos uma expressão popular e rústica com a
aplicação e utilização de materiais vernaculares. Os edifícios são rasteiros,
de pequena escala, ladeando caminhos rurais, adaptando-se perfeitamente ao terreno
e paisagem. As pedras que constituem as casas assentam sobre penedos como se
fossem um prolongamento da natureza. Apenas se vê no rude murado de granito
destas edificações uma pequena porta de madeira, tosca e envelhecido pelo
tempo. As coberturas dc duas águas são como delicadas mantas cobrindo um único
espaço forçosamente tornado rectilíneo através do esforço e vontade humana de
dominar esta natureza agreste.
Este conjunto arquitetónico faz-me lembrar
habitações pré-históricas, construídas por pedras arranjadas e travadas por cunhais
toscos e rudes. Estes palhais formaram um aglomerado ao serem construídos
encostados com o aproveitamento de paredes “meias”. Ao mesmo tempo,
acrescentaram a estes palhais pequenas cercas, como se estas construções
estendessem dois fortes braços murados, onde se abre um portal...
Há cerca
de dois anos, rompeu-se uma nova estrada que arrasou por completo o antigo
caminho medieval, que dava acesso a este lugar. A visita agora tomou-se mais
fácil pois podemos ir ali de carro... Por enquanto, restam os “palhais”, não
sabemos se por muito tempo. Pois o acesso fácil pode, por um lado, levar a um
bom aproveitamento turístico deste conjunto, mas também pode conduzir à sua
total destruição.
Foi pena não se ter mantido aquele
caminho dc pedras medievais. Sentiríamos com maior rigor o tempo daquele sítio
e seria uma mais valia para o património da nossa região…