(Julho de 1999)
"GENTES DA NOSSA
TERRA"
Vou hoje falar de uso em tempos muito implantado
no nosso povo que era o fabrico do pão
caseiro e nada melhor do que falar
das "duas padeiras de Sendim", Amélia do Nascimento, nascida em 17/07/1928 e Eva da
Conceição Veiga, nascida em 02/07/1937, que
ainda continuam embora com carácter particular
e artesanal a fabricar o genuíno pão.
Começo por
falar da mais antiga na arte, a Sr."
Amélia. Iniciou-se nisto à 40
anos, graças à sua sogra, que era padeira. Corn
ela aprendeu toda a arte de fabricar o pão, desde o fazer e preparar o fermento, o peneirar da farinha, o amassar, saber quando o pão está levedado, tender a massa e introduzir a massa no forno a lenha. Legalizou-se como padeira, fabricou
e vendeu pão durante 20 anos. Os clientes eram de Sendim, Arcos, Guedieiros e
Paradela. Fabricava sêmeas (pão grande), trigo
de quatro cabeças, bolas de carne e
de canela, pão de ló, biscoitos, cavacas,
bolos de folar e broa. O pão era
transportado em cestos à cabeça ou carregados num burro. Um trigo custava 2$00 e os comerciantes que o vendiam tinham como ganho o seguinte: em
cada 10 pães vendidos, ganhavam um.
Em conversa recorda e citamos "quando
comecei havia mais quatro padeiras: a Sr.a
Cesaltina, a Sr.a Micas do César, a Sra
Carlota Ferreira e a Sr.a Maria do
Nascimento. Por vezes havia zangas por causa
da hora de cozer no forno" Já agora
refira-se que os fornos utilizados eram
o do Mercado propriedade do então Sr. Aurélio Coelho e o
forno do "largo do forno", já
destruído há uns 15 anos. O aluguer
do forno era pago diariamente com o
pão lá fabricado, ou seja cada padeira
dava ao dono do forno, um trigo grande, equivalente a dois trigos de 4 cabeças e outro a quem fornecia a lenha para o acender. Quem forneceu durante muitos anos a lenha para o forno foi a Sr.a Elvira Formoso, esposa do Sr.João
Gonçalves (João da Lila).
A farinha então
utilizada era moída nos três moinhos que
junto do rio Távora na altura existiam e que mais tarde
foram destruídos pelas águas aquando do rebentamento
da barragem do Vilar. Os moleiros de então eram o Sr. José Pereira (José Moleiro - de Sendim), o Sr. José "Baixo» (de Riodades) e a Sr.a Virgilina (de Guedieiros). Com o fim dos moinhos a farinha passou a vir de Fonte de Arcada e
de Aguiar da Beira.
O pão
fabricado pela Sr.a Amélia tinha grande fama o que fazia com que
outros padeiros não conseguissem vender o
seu pão, e foi graças a isso que lhe
fizeram uma denuncia às autoridades.
"Um dia estava a amassar e
bateram-me à porta. Eram uns fiscais
de Vila Real que me multaram na altura em 800S00".
O facto de ter partido a perna em 1975 e de
exigirem instalações mais modernas, fizeram
com que abandonasse a actividade como
profissional. Contudo manteve e
felizmente ainda mantém o hábito de
cozer o pão para consumo pessoal uma vez por semana.
Foi precisamente em 1975,
mais propriamente em Abril
desse ano que a Sr.a Eva da
Conceição Veiga começou a lidar com o forno e com
o pão. A Sr.a Amélia convidou-a,
ensinou-a e fez dela não só uma parceira como
uma substituta nos dias em que tinha
outros afazeres. E pode parecer que não,
mas ser responsável pelo forno é tarefa de grande responsabilidade, pois se o forno está muito quente o pão sai queimado e as pessoas protestam, se está pouco quente, o pão fica mal cozido e as pessoas reclamam também, pelo que até no aquecer do forno é preciso sabedoria.
Como curiosidade refira-se que uma fornada de pão demora
em média uma hora a cozer.
Hoje o "velho forno" ainda existe e continua em actividade, embora praticamente só ao fim
de semana. Antigamente funcionava todos os dias, agora excluindo a Páscoa, só meia dúzia de pessoas é que ainda cozem o pão.
Já agora valia a pena não só preservar o saber do fabrico do pão caseiro, como recuperar o "velho forno" de modo que
pudesse não só ser um local didáctico
para os mais novos como "museu vivo" com a vantagem de produzir um produto
com características próprias e únicas de grande
qualidade em vias de extinção.
Por: José
João Patrício
Em Julho de 1999
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