Entre a realidade e a ficção
O Natal do menino pobre
O Natal do menino pobre
Numa aldeia de gente muito pobrezinha, vivia um menino e sua avó.
O menino de cinco anos tinha como principal companhia, a sua velha avó. Com idade avançada e notando-se já uma certa invalidez num dos membros inferiores, ao ponto de andar coxeando, com todo o amor e carinho tratava deste seu neto ao qual tinha muita afeição.
Pela altura do Natal, esta ditosa avó contava histórias de encantar no aconchego da lareira imprescindível nas noites frias de Inverno. Contava que o Menino Jesus, pela altura do Natal, descia pela chaminé e depositava uma prenda, a quem fizesse um pedido, num sapato ou numa bota, ao fundo da lareira durante a noite de Natal.
Certa vez, o menino, todo encantado, perguntou à avó:
- Avó? Eu posso estar acordado e ver o Menino Jesus deixar o meu presente?
A avó respondeu-lhe que todos os meninos deviam estar a dormir.
Todas as noites, a avó do menino, quando o ia deitar na sua pobre caminha feita de folhas de milho, rezava-lhe uma oração que o menino, já ensinado, acompanhava:
Menino Jesus,
Minha companhia
Guardai minha alma
De noite e de dia.
Seguia-se a oração do Pai-Nosso e assim, desta forma, o menino adormecia tendo Jesus como vigilante.
Mas daquela vez o menino não conseguiu adormecer. Aguardava o momento em que sua avó se deitasse, que seria mais ou menos na altura em que o lume da fogueira ficaria mortiço e, na sua infantil ideia, à socapa, ia colocar uma peça de calçado ao fundo da lareira.
Já tinha em mente colocar uns tamancos bastante gastos da sua avó que se encontravam atrás de uma velha porta de madeira que rangia sempre que se movia, pois o menino não podia colocar nenhuma peça de calçado sua, porque andava sempre descalço.
Depois de conseguir o seu intento, fechou a velha porta muito devagarinho e foi-se, novamente, deitar, imaginando que no dia seguinte teria lá o seu brinquedo! Um simples carrinho tipo furgoneta!... E, desta forma, adormeceu com um inocente sorriso nos lábios, sempre pensando em Jesus.
No dia seguinte era dia de Natal! O menino mal acordou, logo correu para a lareira na esperança de encontrar o seu brinquedo que pedira ao Menino Jesus. Mas, para sua surpresa, naquele local apenas se encontrava a cinza morta e o tamanco solitário sem qualquer conteúdo!...
Tão grande a tristeza que o menino sentiu naquele momento que não existem palavras no mundo para a descrever! Sentiu-se, subitamente, a tremer de frio. Sua avó, ainda deitada, chamou pelo menino, para que se fosse aquecer junto a si. Aquela pobre mulher, sentindo o menino a tremer de frio, aconchegou-o para junto de si para que melhor se aquecesse com seu corpo. Depressa notou os olhos molhados das lágrimas que o menino derramava em silêncio. Interrogou o menino e este disse-lhe a soluçar:
- O Menino Jesus esqueceu-se de mim, não me trouxe nenhuma prenda!
A pobre velha não sabia como havia de responder ao menino para o confortar. Depois, lembrou-se de dizer que o Menino Jesus apenas dava presentes aos meninos ricos.
O menino começou a pensar na sua real condição acabando por perceber que jamais o Menino Jesus lhe daria algum brinquedo. A sua vida era tão miserável, de sobrevivência apenas. A sua condição era andar roto e descalço e passar fome.
Naquela manhã, depois de comer o já “enfastidoso” caldo de couves, dirigiu-se para a rua na esperança de se aquecer com o sol de Inverno. Deparou-se com outros meninos, mais ou menos da sua idade, que alegremente brincavam com carrinhos e camionetas que o Menino Jesus que lhes havia colocado na chaminé. O menino perguntou-lhes então:
- Vós sois ricos?
Eles simplesmente não responderam e continuaram a brincar. O menino pediu-lhes:
- Deixem-me brincar um bocadinho com essa camioneta! Mas eles, soberbos, apenas a queriam para si. O menino voltou para casa com grande tristeza no coração…
Foi a partir daquele momento que uma grande transformação interna se começou a operar naquela singela criatura. A partir daquele momento mais nenhum alimento entrou em sua boca, simplesmente não conseguia comer, era como se uma bola se tivesse formado na sua garganta! O menino ia enfraquecendo dia para dia. A pobre avó já não sabia o que lhe fazer. Não possuía recursos para o mandar tratar através da medicina, por isso, rezava simplesmente. O menino, já moribundo, falou com a avó:
- Avó? Se eu morrer vou para o céu?
A pobre mulher, com as lágrimas escorrendo sobre seu rosto enrugado, disse-lhe:
- Vais sim, meu querido menino.
- E vou ver Jesus? - retorquiu o menino.
- Vais sim. - Disse a avó enquanto afagava a testa suada daquela frágil criatura.
- Então, avozinha, não chores mais.
Dito isto, o menino deu um suspiro e, na esperança de encontrar Jesus, um sorriso se formou em seus lábios!
Aquela devota avó, ajoelhando-se, invocou as forças divinas para que a alma do menino por elas fosse acompanhada.
No dia do funeral, várias pessoas da aldeia se juntaram para prestar uma última homenagem àquela inocente criatura. E então, uma nuvem no céu se formou, com lindos contornos dourados e uma frágil melodia embriagou todo o ar. As pessoas presentes dirigiram a vista para aquela nuvem que se movia perante elas e, surpreendentemente, puderam observar duas crianças no seu topo brincando. Uma era o menino falecido e a outra era Jesus!
Nelson Cravo
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