domingo, 10 de março de 2013

Boletins antigos - Nº 3 - Património Natural na Região de Sendim


Outubro de 1999

Património Natural na Região de Sendim


         As observações que se seguem baseiam-se apenas na participação nos 2 percursos pedestres organizados pela Associação do Amigos da Região de Tedo Távora, nos dias 3 de Abril e 3 de Julho de 1999.
            A primeira impressão é a notável beleza paisagística do vale do Távora, quando observada a partir de Sendim.
           A vegetação actual encontra-se bastante condicionada pelas actividades humanas, mas contém ainda alguns elementos naturais interessantes.
            Quando os nossos antepassados da Pré-história gravaram cenas de caça nas fragas da margem leste do Távora, toda a região encontrava-se provavelmente coberta de matas densas, que abrigavam e sustentavam uma fauna abundante e diversificada.
         Nas encostas expostas a Norte, mais sombrias, e nas altitudes mais elevadas, as matas eram dominadas pelo Carvalho. negral, de folha caduca.
Nas encostas viradas a Sul, mais ensolaradas, e nas altitudes mais baixas, a árvore mais abundante era a Azinheira, de folha persistente.
Junto às linhas de água (rios e ribeiros) desenvolvia-se uma mata diferente, constituída por Amieiros, Freixos e Salgueiros.
           Veados (o maior cervídeo), corços e javalis pastavam nas várzeas e clareiras das matas, cabras selvagens percorriam os fraguedos e alcantilados das margens do Távora e do alto das serras. Ursos pardos vagueavam no bosque alimentando-se de bagas e de alguma cria de cervídeo mais incauta. Grupos familiares de lobos - as alcateias - dominavam extensos territórios de caça (o território de uma alcateia de 6 a 10 lobos teria uma área dez vezes maior que a freguesia de Sendim).



           Numerosas Aves de rapina (Águias, Bútios, Milhafres, Peneireiros, Grifos, Bufos, Corujas e Mochos) tinham os seus ninhos nas paredes rochosas quase verticais ou nas copas das árvores mais altas do bosque.
Uma multidão de animais de pequeno e médio porte completavam a fauna de então. Carnívoros como o lince, a raposa, o gato-bravo, o texugo, a geneta, a fuinha, a doninha, a lontra, e o toirão. Herbívoros como o coelho, a lebre. Pequenos mamíferos como o lirão, ratinhos, musaranhos e morcegos. Dezenas de espécies de aves, do guarda‑rios à toutinegra, dos chapins ao pica-pau, tordos, melros, pintassilgos, escrevedeiras, perdizes, gaios, galinholas, abelharucos, rouxinóis e muitas outras.
Sobre as rochas expostas, ou no chão das matas, deslizavam répteis como o sardão, as sardaniscas, o lagarto d'água, a cobra-rateira, a cobra-de-escada, a víbora, as cobras-de-água, a cobra lisa, os licranços, a osga.
           Nas noites húmidas do Outono à Primavera, ao eterno coaxar das rãs na orla das linhas de água, juntava‑se o coro grave do sapo‑comum, da rela, do sapo parteiro, do sapo-corredor. Tritões e salamandras saíam dos seus esconderijos e acorriam aos charcos e ribeiros para a inadiável tarefa da reprodução.



           Nos cursos de água cumpriam o seu ciclo de vida as trutas, os barbos, os escalos e bordalos, as bogas, e mergulhavam discretas as toupeiras-de-água.
           Na Antiguidade, um escritor romano descreveu os povos deste canto noroeste da Península: viviam em comunidades guerreiras que habitavam pequenos povoados fortificados, com casas de pedra e telhados de colmo. Cultivavam pequenas leiras, criavam algumas cabras e vacas, e recolhiam bolotas e caça dos carvalhais envolventes.
            Estabelecida a administração de Roma, novas técnicas e novos elementos agrícolas transformaram a paisagem. O zambujeiro bravio das matas mediterrânicas do sul converteu-se na  mansa oliveira. Trazidos dos confins do Império, das montanhas do Médio Oriente, plantaram-se castanheiros, e surgiram os primeiros soutos e castinçais. Os guerreiros converteram-se em lavradores, e nas antigas matas foram abrindo clareiras para vinhas, pomares e searas.
Nas encostas das serras o fogo ateado transformava os bosques em matos onde pastavam cada vez mais cabras, ovelhas e vacas.
A redução das matas levou à extinção os animais maiores e mais vulneráveis - Urso, (antes do sec.XVI), Veado, Corço, Lince, (talvez nos sec.XVIII - XIX), Lobo (há cerca de 20 anos).
Possivelmente a partir do sec. XVIII, foi introduzido o sobreiro, para aproveitamento da cortiça.
         Já no século XX, a diminuição da importancia económica dos rebanhos e consequentemente dos matos levou à introdução de um elemento novo – o e pinheiro-bravo, originário da região litoral do Centro e Norte do País, e plantado em larga escala a partir de 1920.
Os carvalhais desaparecidos, que constituíam o sustento dos primeiros habitantes desta região, deixaram no entanto uma herança ainda hoje utilizada: os solos com aptidão agrícola. No nosso clima temperado, os solos agrícolas de Sendim (bem como da maior parte da Europa) resultam da lenta desagregação das rochas por acção das raízes das árvores, e da acumulação e desintegração das folhas das árvores ao longo de milhares de anos.
As folhas dos carvalhos e azinheiras são rapidamente desagregadas pela acção de insectos, bichos-de-conta e minhocas, e finalmente decompostas por fungos e bactérias, acumulando-se no solo uma fértil camada rica em matéria orgânica.
Infelizmente, as plantações de pinheiros não têm a mesma capacidade de formação de solo. As agulhas dos pinheiros são muito resistentes à desagregação, pelo que se acumula na superfície uma espessa camada de folhas não decompostas, que
inibem o crescimento de outras plantas. O resultado final é um solo cada vez mais ácido, pobre em matéria orgânica.
Os pinheiros-bravos são muito vulneráveis ao fogo, ao contrário dos sobreiros, azinheiras, castanheiros e carvalhos. Nas zonas de maior declive, a destruição da plantação de pinheiros pelo fogo deixa a descoberto um solo empobrecido, onde a capacidade regeneradora da vegetação é lenta. Deste modo, surgem fenómenos de erosão que dificultam ainda mais o processo de regeneração.
Nalgumas zonas dos arredores de Sendim o coberto vegetal
encontra-se bastante degradado, por esta sucessão - pinheiros ‑ fogo.
Noutros locais existe um mosaico de culturas agrícolas, grupos de castanheiros, bosquetes de carvalho-negral, e matos, com uma vegetação diversificada. Possivelmente aqui ocorre uma fauna variada de pequenos mamíferos, aves, répteis e anfíbios.
As margens alcantiladas do Távora são uma zona de nidificação potencial para algumas espécies de aves de grande porte (águias, falcões, grifos). Com alguma protecção em relação a certas perturbações (fogo, caça) seria certamente uma área privilegiada para a observação e conservação de espécies hoje raras.
            Os habitats naturais na região de Sendim estão hoje profundamente alterados pela acção do homem. Há situações de degradação e empobrecimento dos recursos naturais, como o solo. Houve uma regressão acentuada da vegetação, fauna e flora. Mas também há exemplos de situações próximas de um equilíbrio, em que a actividade humana é compatível e até promove uma certa diversidade faunística e de vegetação: estas são as zonas com uma paisagem mais interessante.
* Biólogo da ARTT
(Dr. João Morais)

Boletins Antigos - Nº 3 - EDITORIAL

Outubro de 1999


EDITORIAL


        Nesta terceira publicação do Boletim dos Amigos da Região Tedo Távora continuamos a atingir os objectivos a que nos propusemos, quando da criação do Boletim: divulgar o património ambiental e cutural desta nossa Região e apresentar testemunhos de pessoas que aqui vivem ou viveram...
Neste sentido iniciamos neste número uma rubrica dedicada a pessoas que tiveram influência directa sobre grande parte da população, como é o caso da Prof.a D. Ermelinda Teixeira. Outros existem e se seguirão em números seguintes. Pedimos inclusivamente a quem queira colaborar connosco neste sentido, enviando para a ARTT artigos ou testemunhos de pessoas marcantes na vida desta povoação.
          A divulgação da nossa terra - Sendim – e graças à nossa acção, tem chegado a várias zonas do país, já que temos levado a efeito percursos turísticos e passeios pela natureza que têm sido divulgados em diversos lugares. O que tem feito com que pessoas dessas diferentes áreas do continente aqui tenham vindo continuaremos com estas iniciativas que, julgamos nós têm dado resultados bem satisfatórios.
Com este Boletim pretende-se também apresentar factos e acontecimentos históricos que por aqui tenham ocorrido em tempos passados, com o intuito de mostrar a antiguidade desta Região.
Gratos a todos quantos colaboraram com artigos para que esta publicação continue a ser uma realidade.
A Comissão Instaladora da ARTT

domingo, 3 de março de 2013

Bol. 50 - Lugar dos Associados

LUGAR DOS ASSOCIADOS

(...)

Barreiro-Novembro de 2012
Caros Conterrâneos,
Por ocasião do Boletim Nº 50 não queria deixar de vos felicitar por todo o trabalho desenvolvido em prol da nossa Terra.
É com grande entusiasmo que recebo notícias de Sendim, se bem que agora com a internet estamos mais a par do que se passa, mas é muito bom receber notícias impressas, pois um livro é um amigo.
Tenho todos os números arquivados com muita estima e leio tudo de fio a pavio com muito interesse.
Como é uma edição especial, gostaria de partilhar convosco algumas recordações da minha infância:
Nunca como agora se falou tanto em crise, mas eu acho que crise mesmo a sério, foi nos tempos idos. (Deus queira que não voltem!)
Os meus Pais contavam que no tempo em que eles foram criados, se passava muita fome, mas parece que era geral.
No tempo em que eu e meus irmãos fomos criados já não sentimos isso, porque meus Pais tudo faziam para que assim fosse.
O mesmo não posso dizer no que respeita a ter brinquedos, por isso vou-vos contar um episódio que me marcou para toda a vida pela positiva e negativa simultaneamente.
A minha avó Dolorosa tinha umas primas em Lisboa que costumavam ir à Terra no Verão, ficando sempre em casa de outras primas, a Senhora Corina que era costureira. Essas primas de Lisboa costumavam levar-nos alguns brinquedos.
Houve um ano em que a prima Alice levou uma boneca, que me encheu de felicidade, pois eu não tinha nenhuma. A boneca era quase do meu tamanho, visto eu ser ainda pequenina! Eu levava a minha querida boneca pela mão quando vinha para a rua. Éramos inseparáveis...
Um dia tive a infeliz ideia de ir com ela até á Fonte da Caseira que é ao fundo da minha rua e lá dei banho à minha boneca. Qual não foi o meu espanto!!! A minha boneca estava a desfazer-se! Ninguém me tinha avisado que não a podia molhar porque era de papelão. Já podem imaginar o meu pranto desde a fonte até casa. Foi o meu primeiro desgosto, que me marcou profundamente.
Hoje qualquer criança tem brinquedos, até demais, que acabam por já nem lhes ligar, eu vejo pelos meus netos.
Nunca houve em casa nenhuma tantos brinquedos e tantas roupas como nos dias de hoje!
Para não me alongar nas minhas recordações deixo outras histórias para a próxima.
Resta-me desejar que o Boletim continue por muitos anos, pois tem sido um sucesso.
Até sempre
Da Sendinense
Maria Octávia Almeida Cravo (via correio tradicional)

(...)