SENDIM: Algumas notas históricas sobre a Igreja Matriz
J.M. Cornélio da Silva
Manda a lógica que as primeiras rotas históricas que se
apontem sobre Sendim devam começar pela sua Igreja Matriz: efectivamente, é em
torno dela e pela sua acção pastoral que se desenvolveu e formou historicamente
a unidade moral e social
dos povos que aqui vieram habitar. Por outro lado, trata-se
do momento arquitectónico e artístico mais valioso de Sendim.
Os breves apontamentos que pude compilar resultam da
consulta de algumas obras e documentos, entre eles do vasto repositório de
informação sobre o bispado de Lamego que se ficou a dever ao incansável labor
de Monsenhor Gonçalves da Costa.A primitiva Igreja de Santa Maria de Sendim foi elevada a
Matriz, diz-nos Monsenhor Conçaves da Costa, pela época da reconquista cristã e
com o titulo de Abadia Colegiada, servida por três beneficiados simples.De modo a ocorrer às despesas avultadas com os Estudos
Superiores (a Universidade fora a fundada em 1290 pelo Rei Dom Dinis, localizando-se alternadamente em Lisboa e Coimbra, até se fixar em definitivo
nesta última cidade, mais tranquila e propícia ao estudo do que a já então
agitada Lisboa), elevados encargos que resultavam sobretudo da contratação de
mestres estrangeiros, solicitou D. João III à Santa Sé autorização para
atribuir à Universidade parte dos proventos eclesiásticos de vários bispados. Entre
outros, Santa Maria de Sendim veio a integrar-se no padroado da Universidade
de Coimbra, como donatária da Coroa. Cobrava os dizimos e diversos foros, dos
quais eram retiradas as pensões devidas ao clero da Matriz e Igrejas filiais.
Antes dessa época parece que o respectivo padroado pertencera à extinta casa de
Marialva, aliás senhora da Honra (território privilegiado e isento) onde se
inscrevia geograficamente Sendím.O “padroado” correspondia ao direito de apresentação dos
eclesiásticos a prover nas respectivas Igrejas e que eram propostos ao bispo da
diocese.Parece oportuno lembrar que além do serviço religioso e de
pastoreio espiritual, desempenhou durante séculos a Igreja através dos seus párocos, a totalidade das funções que vieram só recentemente a caber aos Conservadores do
Registo Cvii. Assim o registo do estado das pessoas (assento de baptismo e
nascimento, casamento e óbito), essencial para as garantias e direitos
individuais e para uma boa ordem social era unicamente assegurado pelos
párocos. Diz-nos Monsenhor Gonçaives da Costa que em Aldeia de Sendim os
primeiros livros de assentos de baptizados e casamentos se começaram a lavrar em
1631, e o de óbitos no ano anterior. A Igreja Matriz de Santa Maria de Sendim era
“Reitoria” apresentada
portanto pela Universidade de Coimbra. O seu Reitor nomeava três beneficiados simples da
Colegiada. Explica ainda Monsenhor Gonçalves da Costa que, em rigor, os párocos
apresentados pela Universidade de Coimbra só se deviam intitular “reitores”
caso tivessem obtido um grau académico na Universidade, sendo sem isso simples
vigários.Na Quaresma as procissões da Via-Sacra saíam da Matriz e
terminavam no lugar do Calvário, onde em 1670 0 povo erigiu uma capela em
devoção a Santa Bárbara,Em 1756, uma figura prestigiosa, o Padre Luiz Cardoso, da
Congregação do Oratório e membro da Academia Real de História obteve do primeiro
ministro de Dom José - o Marquêz de Pombal - autorização
para realizar a nível nacional um inquérito junto de todas as paróquias do
Reino. Daí resultaram as "Memórias Paroquiais” ou “Dicionário Corográfico” que
se acha na Torre do Tombo em Lisboa. A cada pároco foi enviado pelo Bispo da
Diocese um exemplar do inquérito que constava de vários ítens numerados, de
detalhada informação sobre a qual se requeria uma resposta.
Era então Reitor de Sendim o licenciado Manuel de
Gouveia Couraça, que presumimos familiarmente ligado à Casa do Paço, situada
no lugar do Paço e à beira da actual Capela de São Miguel. O Reitor Couraça
respondeu detalhadamente em 24 de Maio de 1758 ao referido questionário. E
informou que Sendim era Vila de El-Rei, contando a sua freguesia e termo 312
fogos com 847 pessoas maiores, 59 menores e 13 clérigos.
Respondia também o Reitor que o Orago da freguesia era Santa Maria e que a Igreja tinha um altar
de São Bráz. outro de Sáo Sebastião e um altar das Almas, a que estava anexa
uma numerosa Irmandade que tinha por padroeiro a São Bráz. Acrescentava que a
Igreja não tinha naves mas que possuía “uma sumptuosa Tôrre".
Confirma-nos que o
pároco tinha o título de Reitor,
sendo provido "por oposição” através de concurso na Universidade de Coimbra.
Referia também o Reverendo Reitor Gouveia Couraça quanto a
Ermidas existentes: na serra estava a Ermida de Santa Luzia, em cujo dia se
fazia festa; em um monte junto da Vila a Ermida de Santo Ovídio; entre a Vila e
o lugar de Aldeia a Ermida de Santa Bárbara. Acrescenta que todas elas foram
erigidas e fabricadas pelos moradores da freguesia. Diz ainda que no povo de
Aldeia há outra de São Miguel e em Guedielros a Ermida de São Marcos, cita em
Cabriz ainda outra de Santa Maria Madalena. Também estas erigidas e fabricadas
pelo povo. E indica que num “sítio dospovoado junto ao Rio Távora” se situa a
Ermida de São Sebastiào.Na Vila de Sendim havia, ainda, a Ermida de Nossa
Senhora da Nazaré, que ficava contígua às casas de Miguel de Gouveia, seu administrador (tratava-se de um vínculo com
instituição de Capela anexa). Presumo serem estas as casas muito antigas
situadas do mesmo lado e pouco acima da capela com portal brasonado (pedra de
armas ilegível) que deita para o caminho superior. E outra de Nossa Senhora da
Conceição(?), rio Lugar de Paço contígua "a
outras suas casas”. Em Aldeia havia a Ermida de Nossa Senhora do Rosário, de
que era administrador alguém de apelido Pinto da Povoação de Vilar.A nenhuma das ditas Ermidas, diz o Reitor Couraça,
concorria gente, exceptuando-se naturatmente a de Santa Luzia. Mas haveria
“grande concurso de gente de vários povos” no dia de São Bráz, que se deslocava
à Matriz para venerar uma relíquia do dito Santo que ali se guardava encerrada
“com muita decência em hum sacrário do seu altar, em hum cofre coberto de
veludo carmesim com pregaria dourada, o qual se expõe no mesmo dia a todo o
pov0".
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